domingo, 31 de janeiro de 2016

RESENHA: O MEU PÉ DE LARANJA LIMA

INTRODUÇÃO
   Durante a infância, a imaginação deve ser a principal aliada de qualquer criança. A fuga que um mundo de fantasias proporciona é essencial para conseguir contornar as imperfeições e dificuldades da realidade. Mesmo que isso signifique tornar um pé de laranja lima seu melhor amigo. 
   José Mauro de Vasconcelos recheou a obra "O Meu Pé de Laranja Lima" da ingenuidade e criatividade do universo infantil. Embora também apresente o aperto que Zezé passa junto de sua família paupérrima e as broncas que ele leva ao longo da história, o pequeno garoto encanta seus leitores com suas travessuras, sonhos e reflexões sobre a vida. 

SOBRE A OBRA
   De origem brasileira, contudo publicado em diversos países, o livro de Vasconcelos é, na verdade, uma autobiografia. 
   O livro, segundo o autor, foi escrito surpreendentemente em apenas doze dias. No entanto, ele afirma que a obra já estava pronta a vinte anos na sua mente. "Quando a história está inteiramente feita na imaginação é que começo a escrever. Só trabalho quando tenho a impressão de que o romance está saindo por todos os poros do corpo. Então, vai tudo a jato." (José Mauro de Vasconcelos). 
   "O Meu Pé de Laranja Lima", publicado em 1968, não tardou a ganhar adaptações para o cinema, assim como para diversas peças e novelas. Em 2003, na Coreia do Sul, tornou-se, inclusive, quadrinhos para os fãs. 
   O primeiro filme do livro, liderado por Aurélio Teixeira, foi lançado em 1970. No mesmo ano a TV Tupi encarregou-se de apresentar também a primeira novela. Anos mais tarde, 1980 e 1998, novas novelas foram criadas, mas dessa vez exibida, ambas as vezes, pela Rede Bandeirantes. Até o momento (27/01/2016), a última cinematografia de "O Meu Pé de Laranja Lima" foi estreada em 19 de abril de 2013, no Festival do Rio, sendo dirigida por Marcos Bernstein.

(FILME DIRIGIDO POR MARCOS BERNSTEIN - 2013)
A HISTÓRIA 
   Vindo de uma família humilde e com o pai desempregado, Zezé, o protagonista, e sua família encaram complicações financeiras. Uma destas inclui os atrasos no aluguel da casa onde moram, o que os forçou a se mudarem de lá. Além disso, a mãe, bem como os irmãos de José (Zezé), que não passam de adolescentes, são obrigados a trabalhar para tentar ajudar com as despesas e o novo aluguel. Até mesmo o pequeno narrador de somente cinco anos ocupa-se como engraxate algumas vezes durante o livro. 


(ZEZÉ TRABALHANDO)

   Já na nova casa, uma tradicional brincadeira entre os mais novos é a escolha de uma árvore para si. Claro que quanto mais frondosa, alta e exuberante, melhor para ostentar-se aos irmãos. Começa a busca pela árvore perfeita, mas, por ser o segundo mais novo, Zezé acaba não conseguindo vencer a corrida e chegar até as melhores árvores, sobrando para ele, no fundo do quintal, apenas um pé de laranja lima. 
   Emburrado, tenta protestar, inutilmente. Glória, irmã mais velha, tenta convencê-lo de que a pequena árvore é a ideal, uma vez que, por exemplo, ambos cresceriam juntos, entre outras qualidades. Mas ele nega-se a ser otimista. Até que, num momento, a laranjeira fala com o garoto. Abismado, começa a conversar com a arvorezinha e, a partir desse momento, uma bela amizade se inicia.
   Abusando do imaginário, Zezé diverte-se com Minguinho (pé de laranja), do mesmo modo que nos passeios no "Jardim Zoológico" e noutros jogos que compartilha com seu irmãozinho Luís ou, como gosta chama-lo, "Rei Luís". O estupendo mundo que José cria para se divertir é extremamente belo e com o doce sabor da ingenuidade infantil. As cavalgadas no galho, bem como as feras do "zoológico" que o autor descreve, fazem também o leitor participar da brincadeira, tornando a leitura muito mais divertida.
   Todavia, nem todas as aventuras no livro são ingênuas. O garoto adora aprontar. E todas, ou melhor, quase todas, as suas traquinagens vem acompanhadas de boas surras. Embora haja malandragens, o garotinho apresenta um bom coração e costuma pensar mais naqueles que ama do que em si mesmo. Há ainda a sutileza de seus sonhos, como querer tornar-se um "sábio e poeta e usar gravata de laço." (O Meu Pé de Laranja Lima).


(CENA DO FILME DE MARCOS BERNSTEIN)
   Depois de muitas façanhas, descobertas, reviravoltas e amizades, chega a tragédia. São, na verdade, dois momentos que sem dúvida apertam o coração do leitor. E também o de Zezé. É a partir desses acontecimentos que nota-se a dolorosa e gigantesca mudança no personagem. Desacreditado na bondade das pessoas e em sua própria sorte, juntamente ainda com o ceticismo que esmaga a imaginação e ingenuidade do narrador, este chega a pensar em suicídio. É o amadurecimento de José e Minguinho que revelam o final da história.

IMPRESSÕES E OPINIÕES


   A obra carrega consigo uma leitura simples e agradável que é tanto para um adulto como para uma criança. Não é por se tratar de uma narrativa vinda de um garotinho que Vasconcelos deixou a linguagem infantilizada. É claro que, como estamos falando de um livro infanto-juvenil, não será algo complexo, mas o autor, admiravelmente, consegue adaptar a escrita para agradar qualquer idade. 
   Acredito que muitos, assim como eu, se identifiquem com a criatividade do personagem para complementar suas brincadeiras. Lembro-me muito bem de como adorava brincar com os meus 'amigos imaginários' e Zezé também mostra esse mundo fantasioso, mesmo que à sua maneira. Portanto, reafirmo a importância de incentivar a imaginação das crianças. Tanto para o protagonista, quanto para mim e muitas outras pessoas, esse mundo de fantasias deve ter sido a melhor época de nossas vidas. Nem todo mundo têm uma infância tão saborosa, é verdade. Contudo, todos deveriam experimentar as maravilhas de um universo só seu, criado como você bem quiser; e isso independe da condição financeira, como comprova José. Depende apenas de si.
   A escrita de Vasconcelos consegue também te fazer sofrer, rir, animar-se e desapontar-se junto do menininho. Detalhe também a ressaltar é o carinho que criamos com os personagens. Mesmo que Zezé seja o mais querido, sua irmã Glória, o "Rei Luís" e até o Pé de Laranja Lima, bem como outros personagens, também adquirem a admiração e respeito dos leitores. 
   Além de toda a graça da narrativa, a carga emocional que o livro carrega em si, visto que é uma biografia, eleva ainda mais a obra. Nem todas as crianças saberiam lidar com os acontecimentos que são descritos. E é interessante acompanhar como José Vasconcelos supera esses obstáculos, apesar de, no fim, acabar como a maioria: esquecendo a criança sonhadora que existiu em nós. 


(CENA DO FILME DE MARCOS BERNSTEIN)

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